quarta-feira, 3 de junho de 2015

No país da ignorância

As discussões sobre política de gênero que tanto têm ocupado a imprensa campineira são de um absurdo que dá até preguiça de comentar. Agora, um anúncio do Boticário também acendeu preconceitos vários e até declarações públicas de boicote a produtos da empresa.

O mundo às vezes volta a um passado triste e obscuro. Querer impor uma determinada questão ou um comportamento inusitado à maioria da população de um país na base do grito é tão ignorante quanto execrar as minorias só porque elas são diferentes da maioria.

Na Roma antiga não havia esse problema de definições. O sexo era tão livre quanto os pássaros. As religiões que vieram depois – cristãs e maometanas – é que resolveram impor uma moral que nunca havia existido e que, se continuassem não existindo, tornariam o mundo e as pessoas bem melhores do que são hoje.

Enquanto os religiosos de sempre defendem valores que eles consideram importantes, mulheres são apedrejadas, homossexuais são presos e torturados, minorias cristãs são trucidadas por islâmicos, árabes são mortos por árabes, tribos africanas guerreiam contra tribos africanas e, no Brasil, onde apensa 6% dos assassinatos são esclarecidos, o governo informa que menores cometem quase 2 mil homicídios por ano. Deve ser 6% do total verdadeiro.

Enquanto grupos minoritários tentam impor leis à força que insultam não só religiosos, mas também agnósticos e ateus de bom senso, a nação é subtraída em bilhões por políticos corruptos que têm a simpatia e o voto desses grupos, o país envereda por uma crise econômica cujo fim pode ser o retorno a uma situação em que os ricos serão favorecidos e os mais pobres destroçados e a violência contra tudo e contra todos atinge quase 60 mil assassinatos por ano e centenas de milhares de roubos e furtos são cometidos, a inflação começa a pesar no bolso de quem mais precisa e o governo federal não encontra saída, por incompetente e corrupto que é, para sair dessa situação.

Querer discutir políticas de gênero com uma criança que tenha entre quatro e dez anos de idade, ou mesmo evitar chamá-la de menino e menina é de uma crueldade sem tamanho. Claro que ensinar essa criança a respeitar a todos indistintamente é obrigação de um professor, mas, antes de tudo, é obrigação familiar.

E para que famílias e professores tenham condição de ensinar crianças a respeitarem o próximo como deve ser respeitado, independentemente da cor, da religião, da opção sexual ou do time que torce, a sociedade brasileira precisa melhorar muito ainda. Salários baixos, transporte público deficiente, atendimento médico primitivo, inflação ameaçando novamente, o péssimo exemplo dos eleitos para cargos públicos em todos os níveis, sindicatos de servidores públicos fazem greves político-partidárias, violência selvagem nas ruas, enfim, um cenário de filme de terror que só contribui para que o ódio viceje, para que o cidadão embruteça, para que crianças sejam possessivas e, sem a educação que os pais – mais preocupados em sobreviver – deveriam dar, fazem da escola uma extensão da rua, onde o professor é só mais uma autoridade a ser desobedecida.

Num país onde a ignorância é algo a ser vencido, onde religiões dominam massas gigantescas, onde um partido no poder quer roubar à vontade e impor políticas públicas que privilegiam minorias na marra, onde uma presidente não consegue formar frases inteligíveis, onde a violência campeia solta, há um caminho muito longo ainda a ser percorrido para que a própria população entenda o que é política de gênero.

E antes de eliminarmos os mais de 60 assassinatos por ano, de parar de cometer centenas de milhares de roubos e furtos, de parar de matar mais de 50 mil no trânsito a cada ano e de deixar impunes milhares e milhares de assassinos, ladrões e corruptos, não há espaço algum par discutir qualquer coisa que não seja, primeiro, a volta da dignidade humana que o Brasil está perdendo diariamente.

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