Reproduzo hoje aqui no blog o excelente artigo de Demétrio Magnoli publicado hoje na Folha. Ele desmascara a farsa do “manifesto econômico” produzido
pelo IPEA, cujo presidente é Márcio Pochmann, que foi candidato do PT a
prefeito de Campinas e pode ser novamente o que, para o bem da cidade, espero
que não ocorra.
Aventuras do pensamento mágico
Manifesto econômico do PT é uma fraude intelectual a serviço
de uma farsa política
Demétrio Magnoli
Eles acreditam em bruxas –ou fingem que acreditam. O novo
manifesto econômico do PT e as entrevistas de intelectuais que o sustentam
formam uma fraude analítica similar, na sua desfaçatez, ao assalto promovido
pelos heróis políticos petistas contra a Petrobras. Eles dizem, essencialmente,
que Dilma Rousseff mudou a política econômica para combater uma crise
inexistente, curvando-se voluntariamente aos desejos malvados da "elite
econômica nacional e internacional".
Segundo Márcio Pochmann e Eduardo Fagnani, "a crise,
até 2014, tão difundida como uma crise terminal da economia brasileira, não
encontra respaldo nos dados econômicos". Empregando a fórmula clássica do
governo chavista da Venezuela, os coordenadores do manifesto petista asseguram
que o Brasil foi vítima de "uma crise totalmente fabricada pelo terrorismo
econômico do mercado".
No texto que produziram, a narrativa condensa-se
pela seguinte frase: "A criação de um clima de crise fiscal e econômica
ganhou a batalha, contribuindo para que o governo alterasse sua rota e
produzisse a própria crise que os mercados alegavam existir".
O mercado, por definição, forma-se pelas ações unilaterais
de incontáveis agentes, que operam em busca de maximizar seus lucros. A
figuração do mercado como entidade monolítica, um "Partido da
Burguesia", revela a miséria de intelectuais de esquerda na era do
declínio do pensamento marxista.
Mas, sublimando-se isso, surge um problema
insolúvel de continuidade narrativa. De repente, raio no céu claro, irrompe a
Conspiração, interrompendo a marcha gloriosa das Forças do Bem.
Barack Obama disse que "Lula é o cara". As
agências de risco ofertaram-nos o grau de investimento. Numa capa célebre, a
revista "The Economist" anunciou que "O Brasil decola",
convertendo o Cristo Redentor num foguete em propulsão. No Brasil, banqueiros
declararam-se eleitores de Lula e Dilma, enquanto as empreiteiras associavam-se
à Petrobras em negócios da China abertos e velados. Eike Batista brindou ao
futuro radioso com o chefão lulopetista e sua delfina. O empresariado
seduziu-se pelos encantos materialistas do BNDES, "melhor banco de
investimento do mundo". Os intelectuais petistas nem tentam explicar os
motivos da súbita "revolta da elite" contra o lulopetismo.
A Conspiração, porém, não triunfaria sem um intempestivo ato
de autossabotagem. Na versão servida pelo sociólogo André Singer, ex-porta-voz
de Lula, "ao chamar o ministro Joaquim Levy para a pasta da Fazenda",
Dilma "entregou todos os pontos para aqueles que ela procurou confrontar no
primeiro mandato". Temos, então, que a presidente, ex-guerrilheira não
dobrada pela tortura, convicta nacionalista, venceu as eleições acusando seus
adversários de agentes dos banqueiros apenas para, no dia seguinte, diante de
uma crise artificial, meramente "fabricada pelo terrorismo do
mercado", capitular à Elite, traindo o Povo. A Rainha foi enfeitiçada!,
conta-nos o sábio marxista, um cultor da Razão Dialética.
A fraude intelectual ampara uma farsa política. No manifesto
petista, "a lógica que a presidente usa na condução do ajuste é a defesa
dos interesses dos grandes bancos e fundos de investimento", que
"querem capturar o Estado, privatizar bens públicos, apropriar-se da
receita pública, baratear o custo da força de trabalho e fazer regredir o
sistema de proteção social". Segundo o PT, Dilma tornou-se a quinta-coluna
da "elite econômica nacional e internacional". Mas, surpresa!, o
manifesto e seus arautos jamais sugerem que o PT rompa com o governo,
aliando-se ao PSOL numa oposição de esquerda. Os intelectuais que simulam
acreditar em bruxas almejam ser, ao mesmo tempo, governo e oposição.
Os intelectuais de esquerda não acreditam em bruxas.
Pretendem, isso sim, para corromper o debate público, que todos os demais
acreditem nelas.
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